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Gustavo Cabral

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pokerstars - Escassez de médicos nos municípios não se resolve apenas com 'cubanos'

Recentemente, a Folha de S.Paulo publicou uma matéria sobre a escassez de médicos em diversas partes do Brasil, trazendo dados que mostram que "médicos públicos são raridade em um terço dos municípios". Além dessa matéria, vale à pena citar a publicação do Ministério da Saúde, que diz que "mais de um terço dos municípios do Brasil dependem exclusivamente do SUS", ou seja, não tem serviços médicos privados.

Mesmo que houvesse serviço médico privado em todos os municípios brasileiros, um percentual significativo da população não teria acesso, devido à carência financeira de grande parte dessas pessoas. Dessa forma, não temos como esquecer a importância do SUS, que foi criado para promover, proteger e recuperar a saúde da população, com os princípios da universalização, da equidade, da integralidade, da descentralização e da participação popular.

Porém, ao observarmos a escassez médica nos municípios brasileiros, percebemos que temos um grande caminho para alcançar o que foi pautado no projeto SUS.

Dito isso e observando a situação política nacional, aparecem sempre as "soluções mágicas". Uma delas está relacionada ao programa Mais Médicos e, principalmente, à chegada dos médicos cubanos ao Brasil, ou seja, acabamos entrando na seara da política partidária, ao invés da política de saúde pública.

Ao citar isso, não quero dizer que os médicos cubanos foram irrelevantes, pelo contrário, eles foram muito importantes, inclusive a saída deles deixaram diversas unidades de saúde no Brasil sem médicos, o que afeta grande parte da população mais necessitada, que passa ainda mais por sofrimentos sem a assistência à saúde de forma integral.

Mas será que os "médicos cubanos" foi e/ou será a solução para resolver a falta desses profissionais nos municípios brasileiros?

Pessoal, quando enxergamos uma solução "simples e objetiva" para assuntos muito complexos, podemos não perceber, mas estamos entrando numa jogada política que pode ser estratégico para não assumir a responsabilidade de resolver os problemas com projetos e ações mais bem elaboradas.

Obviamente seria estupidez negar a importância do Mais Médicos e a vinda dos cubanos para o Brasil, pois foi por causa disso que inúmeras famílias tiveram atendimento médico de maneira contínua, por exemplo. Mas o assunto problema é muito maior. Sendo assim, como podemos resolver?

Bom, a resposta é bem complexa e requer um espaço gigante para montar estratégias, com opiniões de diversos especialistas para traçar objetivos de maneira regionalizada, preparar planos de trabalho e execução, assim como avaliação de maneira contínua os resultados obtidos com os trabalhos desenvolvidos.

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Por exemplo, uma estratégia que vem sendo utilizada, apesar de ainda ser muito tímida, é a oferta de "bolsas" para os médicos, com salários relativamente altos comparados a outro tipo de bolsas científicas, para que esses profissionais atuem em locais mais necessitados. Isso é uma estratégia muito boa, pois oferece profissionais qualificados para populações de municípios que têm pouquíssimo acesso aos profissionais médicos.

Além disso, essa estratégia oferece uma excelente experiência aos profissionais, que além de viver a necessidade social e atuar para melhorar a saúde brasileira, conseguem concluir o trabalho e obter mais uma formação, se especializando em medicina de família e comunidade, favorecendo assim a carreira profissional, com uma experiência humana incrível.

Mas não podemos ser inocentes, pois para isso acontecer de maneira eficiente, a oferta financeira precisa ser alta, precisa valer a pena. Muitos profissionais investem muito alto para alcançar a formação médica, então pode ter certeza de que vão querer o retorno de todo investimento e dedicação para se formar como médico.

Outro ponto importantíssimo que precisa ser cada vez mais explorado nesse contexto de formação dos médicos e atuação nas comunidades é a participação das universidades de forma direta e sólida, pois oferecerá um suporte extremamente importante para todo o trabalho dos profissionais. Quando um médico atua em uma comunidade, haverá um tutor, mas quando há um corpo acadêmico atuando de forma mais vigorosa, os trabalhos serão muito mais eficazes e reprodutíveis, além de facilitar o aprimoramento profissional e de atendimento à comunidade.

Mas existem outras questões importantes, entre elas a segurança, pois dificilmente um profissional que tem boas possibilidades de ofertas de trabalho em grandes centros irá largar isso para "aventurar a sorte" em ambientes que não oferecem segurança para trabalhar e viver. Isso é crucial, pois apesar de diversos grandes centros serem inseguros, há possibilidades de buscar estratégias de seguridade.

Porém, quem não conhece bem os interiores brasileiros tende a ficar aterrorizado facilmente com histórias de brutalidades e estatísticas nada agradáveis nos diversos municípios de pouca acessibilidade distribuídos pelo Brasil. Muitos imaginam que vão para um faroeste, onde a sociedade resolve os problemas através de violência. E isso é algo sério! A boa comunicação e orientação não devem ser apenas para as pessoas com pouca informação acadêmica, pois muitos profissionais agem de maneira extremamente ignorante, em especial com questões sociais, comunitárias e relação humana.

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Condições de trabalho também são importantes, por exemplo estruturalmente, pois não dá para encaminhar o médico para um ambiente sem qualquer recurso, e esperar que ele resolva todos os problemas. Além disso, precisamos imaginar que o médico não é escravizado para trabalhar de forma ininterrupta. Dessa forma, quando um profissional vai para determinada região, ele precisa ter certeza de que oferecerá atendimento a um número de pacientes que seja humanamente possível atender. Caso contrário, a desistência será enorme e/ou o profissional sairá doente desses ambientes.

Outra questão que é bastante relevante é a gestão da saúde municipal, ou seja, precisamos olhar para além do ministério da saúde, pois a maioria das questões de saúde é resolvida com as ações médicas municipais. Quando há uma boa gestão, com profissionais capacitados, há a conexão de forma eficiente com grandes centros para encaminhar pacientes de maneira correta para tratamentos mais complexos, por exemplo.

Mas como faremos isso se não tivermos gestores, secretários de saúde preparados para exercer a função? Ou você acredita que em diversos interiores brasileiros o secretário da saúde é indicado por competência?

Para concluir, além dos médicos, temos que olhar para a equipe de saúde e vermos que temos diversos outros profissionais envolvidos, que são peças chaves para que o sistema funcione corretamente. E que existem diversas outras questões que não citei nesse texto, mas o que escrevi foi suficiente para dizer que não busquemos algo simples para questões muito complexas, como a saúde pública brasileira.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pokerstars.

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